quarta-feira, 24 de março de 2010

Perguntas a que um pediatra não deve mesmo responder. (work in progress)


Georg Baselitz





Quando tiveram um filho abriu-se um novo capítulo da sua vida. É como se fosse dia um de Janeiro ou dia um de uma nova vida. Do bebé e deles. Esta criança nova vai cumprir as esperanças desencontradas dos pais. Cada um deles traz dois guiões. Um espontâneo, criado ao longo dos anos. O guião de mãe, construído a partir da identificação profunda com a própria mãe, a mãe real e a mãe ideal. E um guião correcto, o guião do pai e da mãe que todos queremos ser, os pais que fazem as coisas certas, no momento adequado.
O guião correcto está continuamente a ser escrito por todos os que, desde o dr. Spock, querem construir um mundo melhor com gente ilustrada. O pediatra está nesse grupo de gente. O pediatra maître a penser. Aquele a quem se pergunta tudo e a tudo responde. A posição no berço, a cadeira de transporte, a temperatura do quarto, o horário da mamada, a marca do aspirador lácteo, as gotas para as cólicas, as vitaminas, o trajecto do passeio diário.
O pediatra maître a penser gosta que lhe perguntem. Esquece-se de dizer que, na maior parte das vezes, não há evidência científica por detrás dos seu conselhos. Que as suas opiniões se baseiam na experiência individual, na opinião de peritos ou nas práticas da puericultura erigidas em saber científico.
Apesar de ser assim e assim ser apreciado, há perguntas a que um pediatra não deve nunca, mas mesmo nunca , responder. Juntámos algumas, para reflexão dos maitres a penser e dos que, a perguntar, lhes acariciam o ego.

- De que cor vão ser os olhos?
Perguntam na primeira consulta, ou na segunda, inevitavelmente. Pergunta geralmente o pai, na indagação inconsciente de sinais de paternidade. Ou pergunta a avó paterna, por procuração. A resposta popular é :
- Mais escuros, que esta cor ainda é a do leite.
A resposta do pediatra maître a penser é:
- Mais escuros, dependendo dos depósitos de melanina na íris.
A resposta do pediatra moderno é dar o endereço do site Techtech, que ensina a calcular a cor dos olhos a partir dos genes gey e bey 2, que controlam o depósito de melanina (http://museum.thetech.org/ugenetics/eyeCalc/eyecalculator.html).
A resposta eficiente é:
- Vai ter olhos como o pai.
Fortalece a vinculação paterna e é um serviço prestado a todos.
Mas o melhor a fazer é nunca, mesmo nunca, responder.



- Em que idade pode ir à piscina?
À piscina. À pissina (Viseu). À pexina ( Santarém). À pes - sina (Coimbra).
Pode ir quando quiser. Pode até nascer na piscina, em qualquer dos estilos olimpícos, de preferência com uma parteira em escafandro, com treino em suporte avançado de vida. Pode nascer e exibir aos convidados a natação automática, o diving reflex e fazer o contacto pele com pele, na versão húmida. Pode ir para a piscina em qualquer idade, com fralda estanque da Dodot, a fralda-piscina da Dodot. E ir com a avó à hidroginástica e o avô ao tanque da reabilitação. Pode responder o que quiser, que está sempre certo e de acordo com a mais moderna investigação.
Mas o melhor é nunca, mesmo nunca, responder.



- Para as cólicas dou o Simeticone ou o Dimeticone?
As gotas inglesas são melhores, claro. Vêm de Inglaterra, onde os bebés não têm cólicas desde o banimento de Lady Chatterley. Foram aconselhadas por um amigo que trabalha na Sonae e por um pediatra maitre a penser. Em relação à cólica do lactente a resposta adequada é dizer que se ignoram intervenções mais eficazes que os chás da herbanária.
Mas o melhor é nunca, mesmo nunca, responder.

A seguir: Pode ter um gato? Quando deve ir para o infantário? Como fazer a higiene do nariz? E se fosse seu filho?

9 comentários:

  1. ... so far, está hilariante, mordaz, genial! O escafandro da parteira, ah, ah, ah!

    Aspirador lácteo? Dito assim até me dói, eu só uso o próprio bébé...

    Cumprimentos!

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  2. Confesso que julgava que haveriam perguntas piores ;)

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  3. Eu acho que é precisamente o contrário que o texto faz. Não menoriza as perguntas dos pais, mas sim questiona a validade científica das eventuais respostas dos médicos. É que perguntas os pais fazem sempre. Quem de nós, com filhos pequenos, não bombardeia o pediatra na consulta? O pânico que algode mal lhes aconteça é tão grande que as respostas tranquilizadoras de alguém com bata branca, fazem-nos sair dali com a sensação (ilusória) de controlo. A questão aqui é que, de facto, haverá perguntas às quais não há resposta, cientificamente fundamentada, possível. E aí sim, o discorrer sobre assuntos sobre os quais há uma mera sensação ou impressão poderá ser um mero exercício de ego. Agora, quantos de nós percebem que as respostas sobre tudo e mais alguma coisa poderão não ser mais que meros palpites, ainda que venham de uma bata branca?.. E ainda.. quantos de nós não avaliam a qualidade do seu pediatra na proporção directa da quantidade de palpites/respostas que dá a todas as perguntas que nos passam pela cabeça, sejam ou não da sua competência? É que ouvir "essa é uma decisão que terá que tomar", não é nada fácil...

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  4. Eu sou Pediatra. E respondo a (quase) tudo. Mesmo que seja para dizer que não sei..

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  5. quando o meu filho mais velho nasceu, e na maternidade onde nasceu, perguntaram-me se o queria matar quando o deitei de lado, um ano depois ainda era assim em Coimbra mas em Guimarães onde a minha segunda filha teve um breve internamento perguntaram-me se a queria matar quando a deitei de barriga para baixo. Dez anos depois, terceiro filho e a universalidade do barriga para cima. and so on and so far e os pediatras dos meus filhos foram sempre bastante parcos em respostas.Démo-nos bem, com os pediatras e com as crias.

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  6. Não sei se percebi bem o objectivo deste post mas sei que, por exemplo, em relação à piscina as coisas não são tão claras assim (pelo menos dizem alguns pediatras): há crianças que não são aconselhadas a ir (porque têm tendência a ter muitas otites e há primeiro que tentar perceber o porquê ou porque têm problemas de agnoides e amígdalas - são exemplos mas não sei pormenores).

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  7. quando o meu primeiro filho tinha 5 meses perguntei ao seu maitre à penser:
    - Acha que ele pode ir à piscina?
    A sua resposta foi:
    - Sozinho nem pensar!

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  8. pediatra aposentada6 de abril de 2010 às 08:34

    há q ter bom senso e a Escola de Pais vale mais q m.tas perguntas se o tiverem e o q diz a mãe q fala das posições para deitar os bebés é disso o exemplo.....

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  9. Gostei muito do post... porque ri-me de mim própria!

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