segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Adopção

Na semana passada, o Bebé Filósofo foi convidado a estar no Programa Mais Tarde ou Mais Cedo na TSF.
O João Paulo Meneses, autor do programa, é também um pai que passou há uns anos pelo complexo processo de adoptar uma criança em Portugal. Porque nunca tínhamos falado deste tema no BF, pedimos ao João Paulo que nos desse as suas impressões sobre esta realidade, que sabemos ser muitas vezes semelhante a uma longa e frustrante gravidez. Aqui fica.


O que o levou a querer adoptar uma criança?
O desafio de pensar que podia contribuir para um futuro melhor de uma criança e o desejo de ter filhos;

Em traços gerais como foi o percurso?
Demasiado longo, desesperante mesmo, mas visto a esta distância recompensador. É uma prova de fogo que faz muitos desistirem. E acaba por, injsutamente, poder criar expectativas sobre a própria criança, sendo que ela não tem culpa dessa burocracia.

O que acha que está mal nos processos de adopção em Portugal?
A montante está um problema filosófico, o de que as crianças são, de alguma forma, propriedade dos pais. É esse conceito que prevalece na jurisprudência nacional e nas decisões, genericamente, dos senhores juízes. Esgotam-se todas as hipoteses e mais algumas para que as crianças não se desliguem dos pais, mesmo quando é por demais evidente que elas estariam melhor sem eles (ou alguns familiares). Por isso é que há tantas crianças à espera para serem adoptadas e é por isso que é muito raro conseguir adoptar um bebé (o que, felizmente, consegui). Em alternativa deveria prevalecer a ideia de que o mais importante é o interesse das crianças, que - em situações socialmente disruptivas - provavelmente não passará pelos pais biológicos, mas por quem tem amor e educação para lhes dar.

O que devem saber os casais que iniciam estes processos?
sobretudo saber esperar. Preparar-se para o 'pior cenário'; E saber lidar com a burocracia;

Que sentimentos ficam em quem passou por um processo destes?
Não gosto muito de recordar. Prefiro pensar no presente.

O JF chegou com 3 meses num dia 22 de Dezembro. 
Foi, de acordo com o João Paulo, "o melhor Natal das nossas vidas".

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O melhor presente do mundo

Por João Paulo Batalha*

É uma questão de marketing, suponho. Mudar a embalagem, dar-lhe um tom design. Pôr-lhe um daqueles selos tridimensionais com uma figurinha que muda de posição. Talvez ajudasse. É caso, seguramente, para contratar uma consultora estrangeira em marketing criativo que venha definir, a preço de ouro, a melhor maneira de vender a coisa. Porque é mesmo o melhor presente do mundo. A sério.

Várias vezes estive tentado a oferecê-lo aos meus irmãozinhos mais novos (e a cada oportunidade, sei que já viria mais tarde do que devia). Mas depois imagino o ar de desilusão que fatalmente lhes trespassaria a face e desisto – e eles já estão naquela idade em que sabem que é de bom tom fingirem que gostaram da prenda, mas ainda não estão naquela idade (e espero que nunca estejam) em que são bons no fingimento. Seria embaraçoso para todos. De modo que fica por oferecer, o melhor presente do mundo.

Senhores, o melhor presente do mundo: um cartão de biblioteca. Ridículo, não é? Um cartão de biblioteca, o melhor presente do mundo? Para crianças? Em que mundo?

Pois.

E no entanto, digo eu, oxalá fosse o mundo assim tão simples. Assim tão belo. Um cartão de biblioteca em vez de uma boneca esgotadíssima com uma câmara no pescoço (que mente doente se lembrou dessa?) ou um robot-transformer-destroyer para guerras a brincar que, se bem usado, leva o pequenito utilizador a um frenesim capaz de provocar guerras a sério – e ele que vá treinando, isto o mundo é uma selva.

Eis o problema: os tipos do marketing trabalham para o inimigo. Tal como um bom brinquedo – ensinam-nos eles – o amor é grande e brilhante e tem luzinhas e várias peças que se movem e dispara raios mortais pelos olhos e é capaz de destruir uma cidade e tirar vidas carregando no botãozinho (pilhas vendidas separadamente).

Além de que, na era do Google e da Wikipedia, ir à biblioteca para quê? Pior: ler para quê? É uma pergunta assassina nos tempos que correm, porque exige uma resposta longa e aborrecida – e isso já não se usa. Exige explicar que ao contrário de um filme ou um vídeo, que acontecem nos nossos olhos, a leitura acontece na nossa cabeça, na nossa imaginação. Ao ler um livro estamos a criá-lo, estamos a escrevê-lo na nossa mente, na nossa fantasia, com as palavras que tomamos emprestadas ao autor. Estamos a desenhar as feições das personagens, a arquitectar as cidades e os espaços na nossa imaginação.

Um filme é um filme, um jogo é um jogo. Estão ali à nossa frente e, bons ou maus, são o que são: os seus criadores construiram um universo visual, uma narrativa, e mostram-na tal como a imaginaram. Eles criaram, nós consumimos. Um livro não, porque um livro passa-se na nossa cabeça, porque não sendo visual obriga-nos a visualizá-lo na nossa imaginação. Um livro, o autor limita-se a escrevê-lo. É o leitor que o cria.

Ler por isto, digo eu. Ler porque não há substituto. Ler porque procurar uma coisa no Google não é aprender, é consultar. Ler porque das duas umas: ou alimentamos a nossa cabeça com produtos acabados – e aí somos consumidores – ou alimentamo-la com matéria-prima – e aí somos criadores.

As bibliotecas hoje, garanto-vos, existem em todos os cantinhos deste país e existem felizes e de portas abertas. E adoram crianças, e as crianças retribuem. Com espaços e programas especiais para o público infantil, com leituras de contos, com actividades, com descobertas. Porque também se aprende a leitura, e a relação com o livro, e a responsabilidade de levar um livro para casa e ter de devolvê-lo a tempo e em condições, porque ele pertence aos outros, aos nossos vizinhos, à comunidade, ao mundo. E aprende-se a solenidade saborosa de estar em silêncio numa sala de leitura – que é um ambiente que pode intimidar uma criança, “pouco barulho que há pessoas a ler”, mas que se aprende e que se adora (ou não me digam que o que se ama, o que verdadeiramente se ama nesta vida, não teve de ser aprendido?)

E é grátis. Digam-me lá, gurus do marketing, não se faz daqui uma campanha?

*Formado em História, João Paulo Batalha é jornalista e fundador da Storymakers, uma empresa dedicada à produção de exposições, eventos e produtos culturais para crianças. 

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O Bebé Filósofo à conversa na TSF

Esta terça-feira, das 15 às 16h00, o Bebé Filósofo vai estar no programa Mais Cedo ou Mais Tarde da TSF, à conversa com o João Paulo Menezes.

Tentar explicar o que nos levou a isto de tentar ser filósofo (e bebé) num mundo de gente grande.

O amor (aos 4 anos)

Amar é quando o coração bate muito depressa e a nossa cara fica vermelha quando olhamos para o namorado. Eu sei que é assim mas nunca senti, porque isso é só quando somos muito crescidos.


(ainda bem. ainda bem)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Medicamentos manipulados comparticipados a 30%

Foi publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 242 — 16 de Dezembro de 2010 a nova tabela de medicamentos manipulados com comparticipação a 30%.

Esta publicação representa o culminar de um processo de quase quatro anos que contou com os esforços conjuntos da Comissão do Medicamento da Sociedade Portuguesa de Pediatria (SPP), do grupo do medicamento da Comissão Nacional da Saúde Materna, da Criança e do Adolescente, e a intervenção directa do Conselho Directivo da  ARSNorte, IP,  junto do Infarmed, para além do envolvimento de pais de crianças doentes. Estas entidades envidaram esforços conjuntos com entrevistas no Infarmed e entrega de processos organizados com base em  documentos e inquéritos  aos pediatras sobre os fármacos que, em sua opinião, deviam obter comparticipação do Estado.

Este apoio ainda não é o ideal, já que, de acordo com a responsável pela Comissão do Medicamento da SPP, Helena Jardim, o pretendido era a comparticipação de 50% do custo dos fármacos, mas, tendo em conta a conjuntura actual, “representa já uma grande ajuda para muitas crianças e famílias”. 

Os medicamentos manipulados são fármacos processados especialmente para crianças, em fórmulas adaptadas especialmente para a idade pediátrica (por não existirem em suspensões, soluções ou xaropes) e que, por serem processados manualmente nas farmácias e de forma individualizada para cada doente, são muito caros. Acresce a esta realidade o facto de que a  maior parte das crianças que exigem estes fármacos são as portadoras de doenças crónicas que necessitam, por vezes, de vários destes preparados, de forma prolongada e com frequentes reajustes das dosagens  pelo que os custos para as famílias são muitas vezes incomportáveis. É de realçar que a literatura científica sublinha que as doenças crónicas são significativamente mais prevalentes entre as classes mais desfavorecidas pelo que a não comparticipação destes medicamentos representava um acréscimo a este grave problema social.

A SPP reconhece a importância deste apoio para as crianças com doenças crónicas e suas  famílias e, de acordo com Helena Jardim, “Fica a sensação gratificante de que, em união e com objectivos válidos e bem identificados, se podem minorar  dificuldades”.


quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Aprender a criar (e a programar telemóveis)

Por João Paulo Batalha*



Às vezes sinto-me entalado pela História. Nascido em 1978, fui educado no séc. XX mas vou viver no séc. XXI. Quer dizer, a idade em que me diziam “tu não tens quereres” durou até mil nove e noventa e tal; as contas para pagar começaram a vir pela passagem do milénio. Bill Gates e Steve Jobs lançavam a revolução do computador pessoal mais ou menos pela altura em que eu entrava na escola. Tive de ir aprendendo a lidar com um mundo tecnológico ao mesmo tempo que ele ia sendo inventado. Nenhum primeiro-ministro me deu um magalhães para eu me entreter e, nos intervalos de me entreter, talvez aprender alguma coisa.

De modo que me sinto sempre ridículo a manusear um touch-screen. Hesito. No screen com que eu cresci, não era por pormos os dedos no ecrã que os actores da Globo iam para a direita em vez da esquerda. Só servia para a minha mãe se chatear porque tinha de limpar as dedadas. Acharei sempre natural que um touch-screen não funcione quando eu lhe toco (e não funciona mesmo; eles cheiram o medo) e que alguém que vá a passar perceba que eu sou apenas um idiota a tentar tocar um mundo que não é o meu.

Os miúdos de hoje não. Já nascem neste mundo tecnológico maduro. É por isso que quando um miúdo de dez anos me programa trinta tons de toque diferentes no telemóvel, consoante quem me ligue, o meu instinto é amuar. Raios, parece que já nascem ensinados! A questão é que não nascem. A tecnologia é-lhes intuitiva, sim, e isso abre-lhes imensas oportunidades, claro. Mas entre a oportunidade e a recompensa está a obra. O trabalhinho. E esse é mais importante hoje do que era no tempo dos meus pais, quando o emprego era mais certo e era para a vida.

Por isso não posso amuar. Tenho de me sentar ao lado do miúdo, eu que cresci com dois canais de televisão (mais o Tal Canal), e pedir-lhe que me ensine uma tecnologia que me irrita, que me faz sentir um homem lento num mundo rápido. Preciso das lições de um miúdo de dez anos para me manter um homem inovador (parece que isso hoje é a chave de todas as coisas), mas preciso sobretudo de lá estar para lhe pagar a lição.

Os gadgets têm vida curta e há sempre uma coisa nova para nos entretermos (juro que me parece que, literalmente de uma semana para a outra, toda a gente em Portugal arranjou um iPad). Entregarmos as crianças ao magalhães, à TV Cabo e à Internet e admirarmos a sua habilidade com as tecnologias não chega. No que toca a educação, sou um espartano: sou aquele tio que oferece prendas pedagógicas, mesmo que mais aborrecidas. Abre-se, não é tão divertido como a arma de brincar ou a consola de jogos, fica de lado. Tanto pior. Vai devagarinho. Insiste-se, puxa-se pela cabeça da criança – e na cabeça de uma criança livre cabe muito mais imaginação do que na de mil programadores de vídeojogos.

Porque o ponto é este: um jogo, um filme, um site – mesmo um brinquedo – são a imaginação de outra pessoa. São o ponto de vista de outro. Saber manuseá-los, consumi-los, é óptimo. É literacia tecnológica. Mas literacia não chega. Se formos pais conscientes, queremos que os nossos filhos aprendam a consumir, claro (melhor do que nós, de preferência, com mais inteligência e menos dívida acumulada). Mas, melhor do que consumir, queremos que os nossos filhos aprendam a criar.

É esse o negócio que tento fazer com um miúdo de dez anos que me programa os toques de telemóvel: maçá-lo com perguntas. Porquê assim? Porque não assado? Para que serve isto? E para que poderia servir? É este o negócio: ajuda-me a usar as ferramentas que alguém criou, e eu tento ajudar-te a criar as ferramentas que alguém há-de usar.

*Formado em História, João Paulo Batalha é jornalista e fundador da Storymakers, uma empresa dedicada à produção de exposições, eventos e produtos culturais para crianças

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Parabéns, Bebé!



Faz anos hoje o nosso Bebé Filósofo. Um ano certinho. E como em todos os primeiros aniversários, também neste se mistura uma sensação de orgulho, surpresa e vontade de recordar todas as conquistas e os bons momentos.

O Bebé nasceu no dia 1 de Fevereiro de 2010. Foi do Luís Januário o primeiro post. Dizia ele que,


E sim, foi com liberdade que resolvemos falar das coisas numa perspectiva diferente. 
Procurando nexos causais ou evitando-os, consoante os dias. Tivemos muitos autores convidados. 


Seguimos as pegadas do desenvolvimento infantil, como se de um verdadeiro Bebé nos tratássemos. 


Falámos de amamentação, de vinculação, dos perigos, das birras
Fizemos perguntas. Muitas. 


Contivémos as lágrimas para não chorar em público e dançámos sob o sol.



E dissemos que queremos crianças que brinquem mais e trabalhem menos.


Demos muitas dicas e falámos sobre o futuro.  



E vamos continuar por aqui, porque passou um ano mas ainda continuamos com tantas dúvidas. 
A infância é o local mais importante da vida.
Como poderia alguma vez deixar de ser tema para boas conversas?