Não é por serem nossos filhos, mas eles são mesmo lindos, inteligentes, divertidos, boas pessoas, etc, etc... Enfim, tudo de bom! E nós não nos cansamos de o dizer! Lá em casa, acreditamos que a promoção da auto-estima torna-os mais seguros de si mesmos, que os ajuda a gostar deles e a serem melhores. Mas, por vezes, caímos no ridículo.
Ele faz um traço, olhamos maravilhados e dizemos: “Tens mesmo jeito, talvez possas pensar numa carreira na arquitectura”. Ela dança e canta: “Podias actuar na Broadway!”. Ele tem um paladar apurado: “Quem sabe não serás um afamado cozinheiro ou crítico gastronómico?”. O sentido de humor deles é imparável: “Gato Fedorento, cuidem-se!”
Às tantas, eles gozam connosco: “Ai, vejam bem, vejam bem, como ele é tão bom a abrir a mãozinha, olhem! Ai, a mãozinha aberta e agora... Fechada! Ai que inteligente!”, diz ele, com mais cinco centímetros do que eu, a imitar-me a voz e os movimentos. “Olhem como ele sabe tão bem despejar o lixo, talvez vá para almeida!”
Contudo, desde que li Choque na Educação – Como os nossos erros estão a afectar os nossos filhos e o que podemos fazer para educá-los melhor, do jornalista Po Bronson e da educadora Ashley Merryman, publicado pela Lua de Papel, e citei algumas partes ao pai, que controlamos o nosso ímpeto de elogiar.
Bronson e Merryman lembram que A Psicologia da Auto-Estima, de Nathaniel Branden publicada em 1969, defende que a auto-estima é a qualidade mais importante de uma pessoa. E que, desde então, esta ideia teve uma enorme repercussão na sociedade americana com consequências. De repente o culto da auto-estima servia para combater todos os males da sociedade. Por exemplo, em 1984, a Califórnia introduziu legislação que promovia que nas competições os treinadores de futebol deixassem de contar os golos e passassem a dar troféus a todos; os professores deixaram de corrigir a vermelho, tudo para não prejudicar a auto-estima dos mais pequenos.
Segundo uma meta-análise feita a 200 estudos sobre o tema, concluiu-se que “uma elevada auto-estima não melhorava as notas nem o sucesso profissional. Nem sequer reduzia o consumo de álcool. E muito menos contribuía para a diminuição de qualquer tipo de violência”.
Na verdade, os elogios às crianças podem ter um efeito contrário: “os alunos elogiados passam a evitar correr riscos e a sentir-se menos autónomos (...); [têm] uma menor persistência na execução de tarefas (...). Quando chegam à universidade, os alunos muito elogiados desistem frequentemente de disciplinas quando estão em risco de receber notas medíocres e têm dificuldades em escolher uma major – têm medo de se comprometer com algo porque têm medo de falhar.” Mais. Quando crescem, estas crianças tornam-se adultos competitivos e interessados em destruir os outros porque têm que preservar a sua imagem.
Depois de lermos e comentarmos estas páginas constatamos que algumas destas coisas já aconteciam: “X” não se esforça porque tem medo de errar; “Y” é pouco persistente. Mudamos o registo de comunicação. Agora dizemos: “Nada se consegue sem esforço. É preciso trabalhar. Tens que pensar. O cérebro é um músculo que tal como os abdominais tem que ser trabalhado.” Deixámos de elogiar o global – “és tão bom!” - e passamos ao particular, a elogiar a persistência, o trabalho concreto, o esforço que fazem para conseguir uma coisa.
Mas, entre nós, mãe e pai, continuamos a comentar como eles são fantásticos, maravilhosos e nos enchem de orgulho a cada dia que passa, ou seja, auto-elogiamo-nos-a-nós-mesmos (perdoem a redundância)!
*Bárbara Wong é jornalista no "Público" há 13 anos, especializada em temas de Educação, Ensino Superior e Família. Em 2005 ganhou o prémio de jornalismo "A Família e a Comunicação Social", com um texto sobre os pais que partilham tarefas com as mães, intitulado “Um homem na sala e na cozinha”.
Em 2008 publicou o livro "A Escola Ideal: Como escolher a escola do seu filho dos 0 aos 18 anos". É co-autora, com a professora Ana Soares, do blogue Educar em Portugues. É casada e mãe de um rapaz e de uma rapariga.
É bom ver que a ciência pedagógica começa a regressar ao bom-senso, depois de nos anos 60 e 70 ter caído nos excessos de mimo patentes na ideia de promover (gratuitamente) a auto-estima. O excesso de mimo rouba as crianças da sua autonomia, torna-as dependentes do elogio, da validação por parte do Outro. É um excelente conselho elogiar as nossas crianças por coisas concretas e particulares, apontar-lhes o que fizeram bem. E conter o impulso para estarmos constantemente a celebrá-las por tudo o que façam. Obrigado pela reflexão!
ResponderEliminarObrigada pelo texto e pela reflexão.
ResponderEliminarComo são temas do seu interesse deixo a divulgação de um congresso a acontecer em Abril com o tema "Educação e Parentalidade" que pode consultar aqui:http://www.educacaoeparentalidade.pt.to/
Obrigada
Rita Banza
Não é fácil este tema e levanta questões interessantes. é um facto que as crianças que crescem rodeadas de exclamações apoteóticas sempre que abrem a boca ou dão um passinho, tornam-se reféns dessa necessidade de elogio constante e no embate com a sociedade "real", acredito que desenvolvam rapidamente a sensação de que eles é que estão certos e o resto do mundo errado. Na minha casa nunca houve prémios para boas notas ou dinehiro para por no mealheiro sempre que se passava de ano. "Não é mais do que a vossa obrigação" diziam os meus pais. E crescemos assim, a procurar fazer as coisas bem feitas, com brio e rigor, o que afinal não é mais do que a obrigação de cada um de nós. Mas, no entanto, sinto que sempre fui muitíssimo elogiada. Não sei precisar bem como, mas lembro-me da sensação de satisfação por sentir reconhecidos os meus esforços. De sentir que estavam orgulhosos de mim, quando um objectivo era alcançado, mesmo sem o dizerem. Talvez seja o que a Bárbara fala, de realçarmos o trabalho, o esforço, a persistência, no fundo o elogio das pequenas coisas. Saber elogiar é fundamental, fintar o mero insuflar de egos infantis também. Onde estará o caminho certo?...
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