segunda-feira, 12 de abril de 2010

A importância do pré-escolar

Por Bárbara Wong*

Quem não inveja, nem que seja só um bocadinho, as glamorosas donas-de-casa norte-americanas, que tomam conta dos seus filhos desde que nascem, ponha o dedo no ar. Não vejo um único dedo no ar! Elas existem, não é só nos filmes mas na vida real. São mulheres que estudaram, completaram o ensino superior mas os ordenados dos maridos permitem-lhes ficar em casa, ser mães a tempo inteiro e cozinheiras fabulosas, que fazem bolos com vários andares e cheios de cores (estou a exagerar).

A verdade é que elas ficam com os miúdos em casa até aos seis anos, idade com que entram para a escola. O pré-escolar existe nos EUA mas ou é para as crianças oriundas de famílias que podem pagar centenas de dólares mensalmente para estarem no jardim-de-infância ou para os mais desfavorecidos, aqueles para quem o inglês não é a língua materna, para os filhos de mães trabalhadoras, ou seja, para as crianças para quem o pré-escolar foi pensado como uma maneira de esbater as desigualdades à entrada do 1.º ciclo.

No primeiro dia de aulas, numa turma de 1.º ano, a professora chama o aluno pelo nome e ele não responde, a professora insiste até que o miúdo se apercebe e responde-lhe: “Eu não me chamo John, o meu nome é Mad Man (uma alcunha)”. Há crianças que chegam ao primeiro ciclo sem saber o seu nome próprio, afirma Sambie Shivers-Barclay, do departamento de Educação de Washington, DC, depois de contar a história e continua: “Há crianças que entram na escola e não sabem o nome, não sabem os números nem o alfabeto, não sabem sentar-se a uma secretária porque a única coisa que fizeram até então foi estar sentadas frente à televisão”, reforça.

O pré-escolar não é obrigatório nos EUA e por isso a aposta tem sido muito pouca neste nível de ensino. Por isso, existem milhares de jardins-de-infância com listas de espera, onde as direcções podem escolher os alunos e onde os pais que podem prometem mundos e fundos para que os filhos ingressem; mas também existem os que têm listas de espera para receber os mais pobres, os que têm necessidades educativas especiais, os que não sabem inglês.

A administração Obama tem dado particular importância ao pré-escolar como um meio para combater as desigualdades e de promover o futuro sucesso escolar. No final do ano passado, o governo federal disponibilizou mil milhões de dólares para que os 50 estados desenvolvam programas de pré-escolar. Enquanto por cá ainda nos escandalizamos porque a oferta do pré-escolar não atingiu os 100 por cento; no estado de Oklahoma apenas 55 por cento das crianças de quatro anos frequentam, ao passo que no Nevada apenas um por cento o faz.

Mas, como dizia no princípio, muitas mães estão em casa e os condados oferecem outras alternativas como o “day center”, onde a criança pode passar duas ou três horas diárias ou estar algumas vezes por semana, a fazer actividades semelhantes às desenvolvidas no pré-escolar; ou programas onde mães e filhos podem participar em conjunto.

A aposta tem que ser num pré-escolar com qualidade, como dizia Claire Hamilton, professora da escola superior de educação da Universidade de Massachusetts, “o pré-escolar pode ser qualquer coisa mas é o que vai marcar os alunos para o resto da vida. É o que vai determinar o futuro da criança se esta começar a ouvir falar sobre a universidade quando ainda tem quatro anos”. Ou seja, quando os pais têm poucas ou nenhumas expectativas, o pré-escolar pode e deve – lá como cá – fazer a diferença na vida das crianças, desde a mais tenra idade.

*A jornalista viajou a convite do Departamento de Estado dos EUA e a viagem foi financiada pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento.

10 comentários:

  1. Concordo que o pré-escolar é fundamental. Fundamental para a aprendizagem da socialização, para iniciar os primeiros saberes, para preparar as crianças. E é ainda mais importante para as que têm menos atenção em casa, que têm pais menos atentos, menos ambiciosos quanto à educação dos filhos. Mas infelizmente, quando os pais não se interessam, tudo o que um sistema de ensino pode conseguir, se tiver sorte, é dar aos miúdos uma magra compensação pelo estímulo que lhes falta.
    Os EUA também têm leis muito mais liberais no direito à escolarização em casa do que nós temos na Europa. Seria interessante perceber o que é que essas crianças que são educadas em casa, pelos pais, andam realmente a aprender.

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  2. eu invejo essa possibilidade, invejo sim senhora. Mas só posso comentar uma realidade que conheço, lá está, dos filmes. E que me deixa perplexa porque, neste imaginário,as "stay at home mums" são também vítimas de uma auto-exigência avassaladora que leva a depressões e automedicações com ritalinas e afins... Não serão todas, claro, mas faz pensar que o stress do trabalho acaba por ser transferido para a vida doméstica e que a pressão para se ser perfeita existe em todo o lado. Mas este comentário nem tem a ver com o tema do post, o do ensino pré-escolar... Quanto a isso sinto-me indecisa. Por um lado, houvesse a possibilidade universal de as crianças estarem com os pais e estes fossem capazes de lhes estimular o gosto de aprender e a criatividade e quanto a mim seria infinitamente melhor. por outro lado, isso é quase a apologia do impossível.. O que eu acho é que o pré-escolar hoje é pouco mais que um conjunto de criancinhas em rebanho a bater palminhas e a fazer digitintas. Uma pena. É pouco... tão pouco. Mas como dar a volta a isto?...

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  3. Eu acho que sou uma stay at home mum. Sou professora e só concorro para duas escolas aqui ao pé de casa e de vez em quando lá calha um horário de meia dúzia de horas durante um mês, por isso na maior parte do tempo acho que sou uma stay at home mum! Acho que muitas até podem ficar em casa porque o ordenado do marido cobre as despesas, mas também há aquelas em que o próprio ordenado não daria para pagar a escolinha e por isso ficam em casa com os filhos. Pessoalmente, prefiro viver com menos regalias financeiras e estar a tempo inteiro com o meu filho (e em breve serão 2) e cuidar da casa do que andar a esfalfar-me para dar o ordenado à creche ou pré-escola. Ele está comigo em casa e de vez em quando com a avó, quando tenho uma colocação, e é bastante sociável e desenvolvido, sabe fazer/dizer muitas coisas e tem comportamentos que crianças de 3 anos que andam na escolinha não sabem.
    Ah, concordo com a constança na questão do rebanho. E eu detesto rebanhadas!

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  4. O pré-escolar não pode, nem deve ser só digitintas e rebanhos! tem que ser aprendizagem do estar em sala, do conviver com outras crianças, do trabalhar em colaboração, do partilhar, do aprender a cumprir horários, do aprender coisas que em casa os pais não conseguem transmitir na totalidade. Claro que eu adorava ter tido tempo para estar em casa com os meus filhos bebés e tenho a certeza que ensinar-lhes-ia imensas coisas. Eu canto, danço, faço teatro, pinto, moldo, recorto, conto histórias, interpreto-as, faço piruetas e palhaçadas como ninguém, que o digam os meus filhos e sobrinhos! Sei entrar numa livraria e escolher os melhores livros, os que os desafiam. Sei escolher um programa de televisão ou um filme. Mas não seria a mesma coisa, teria mais dificuldade em ensinar-lhes as noções matemáticas mesmo se fizessemos bolachas e outras medições na cozinha. Se tivesse ficado em casa, os meus filhos ganhariam umas coisas mas perderiam outras como as amizades, as rotinas, as conversas entre pares, um mundo de coisas. É que por muito boa educadora que eu acredito que seja não sou completa, nem perfeita. BW

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  5. Bárbara, é precisamente aí que encontro a mais-valia da escola em idades pequeninas. Eu sinto-me perfeitamente incapaz de transmitir essa importância dos horários da estabilidade, essa segurança das rotinas, essa noção de grupo que sei que eles aprendem na escola. E por isso fico contente por ter a minha filha no infantário, porque eu sou semi-caótica e ela beneficia desse enquadramento que a escola dá. Mas acho que a criatividade de que falas, o ler bons livros, o teatro, a crítica... isso é raro encontrar na escola. E, tudo bem, concordo que nos deve caber a nós pais introduzir essas coisas e não estar a espera que o façam por nós... Bolas são nossos filhos afinal! Eu só tenho pena é que não haja também mais disso na escola, porque em quantas famílias onde não há tempo para mais nada, acabam as crianças por ficar privadas desses estimulos?

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  6. Eu também sou uma stay at home mum..por enquanto. Fiquei desempregada e como há males que vêm por bem, fiquei grávida e nasceu a minha filha que tem agora 15 meses. Felizmente temos tido, até agora, a possibilidade de "nós" (eu e ela) estarmos em casa. Vivemos mesmo ao lado de um infantário, onde eu oiço todos os dias os bebés a chorarem (e muito), a brincarem (também) e as respectivas educadoras a falarem, não tenho nada contra, um dia terei de "libertar" a minha filhota mas..não imaginam como me sinto feliz por estar a poder acompanhar todos os passos do crescimento dela, as primeiras palavras, os primeiros passinhos..tudo. Comparando com as outras crianças da mesma idade, ela está muito desenvolvida. Todos os dias tenho de ter muita criatividade, muita imaginação, muita paciência, mas tenho acima de tudo uma grande alegria, boa disposição e a perfeita noção que tenho muita sorte em poder fazer parte,a tempo inteiro deste início de vida dela!

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  7. Constança, concordo contigo em tudo! E lamento que nem todos os pais possam ir ao teatro, a exposições, viajar com as suas crianças, etc. Por isso, por muito que se queiram esbater diferenças entre os meninos, elas existem sempre. E aqui é que devia entrar o pré-escolar de qualidade com educadoras que os levam em visitas de estudo ao teatro, que lhes lêem bons livros e dão bons exemplos. BW

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  8. Senhoras e mamas,
    eu sou uma das maes dos filmes americanos.
    Vivo nos EUA e tenho uma filha de 3 anos e 1/2.
    Sou o que voces chamam a "stay at home mom" no vosso blog.
    Deixem-me explicar-vos o porque das stay at home moms nos EUA:
    1. as pre-escolas sao privadas (nao do estado)
    2. o custo duma pre-escola mensalmente e cerca de $1000 e e so para 3 horas de manha ou de tarde!
    O chamado kindergarten que comeca aos cinco anos e obrigatorio e gratuito mas, e so de manha (4 horas)
    Uma mae que nao cursou (college) traz para casa entre $1300 e $1700 por mes, como veem nao da para ir trabalhar 3 horas de manha e trazer para casa $1000 para a pre-escola.
    Ganha-se mais ficar em casa mas, nao e nenhuma sobremesa, porque estas idades necessitam de comunicar e aprender coisas novas todos os dias por isso a minha filha ja anda na pre-escola desde setembro do ano passado.
    E realmente o melhor para a crianca mas, nos EUA 95% das stay at home moms sao obrigadas a isso por causa dos custos!

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  9. Os meus filhos foram os dois para a creche aos 5 meses. É ben+efico nessa idade? Não me parece. As desvantagens são seguramente maiores e em maior número do que as vantagens. Agora quando falamos de pré-escolar, a partir dos 3 anos, já acredito mesmo que é bom para eles. E da experiência que tive com o mais velho, e estou a ter agora com a mais nova, o pré-escolar vai muito mais além do "rebanho a fazer digitintas". Admito que até mais do que de escola para escola, estas diferenças se notem de educadora para educadora. E nisso sim tive muita sorte com as duas educadoras que nos/lhes calharam na rifa. São as duas espectaculares.

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  10. Esta é a segunda semana de pré escolar do meu filho que tem 3 anos.
    Está a ser complicado, ele estava com a avó durante o dia enquanto nós pais estamos a trabalhar. Estava habituado a uns horários e agora na escolinha tem outros que têm obrigatoriamente de ser cumpridos. Está a custar-lhe um pouco, principalmente a parte do dormir àquela hora certa tendo sono ou não, mas sei que lhe vai fazer muito bem. Noto algumas diferenças nele, acho-o mais teimoso, birrento, desafiador... espero que seja somente uma fase e que nós os pais consigamos dar a volta a isto da melhor forma. Sei que estamos a fazer o melhor para ele neste momento colocando-o no pré-escolar, por muito que lhe custe e a nós também.

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