segunda-feira, 5 de julho de 2010

O que fazer com os miúdos?

Por Bárbara Wong*



Os mais velhos, eu e dois dos meus primos, todos com menos de dez anos, carregávamos os baldes, as pás e tomávamos conta dos mais pequenos, a mais nova tinha um ano, ainda precisava do carrinho. Chegávamos à praia e a minha avó sentava-se, grande, no seu fato-de-banho de fundo preto e florinhas pequeninas, de óculos de sol e chapéu de palha de abas largas, a conversar com as vizinhas, das barracas ao lado - as amigas que revia anualmente, que nos diziam como estávamos crescidos e bonitos -, mas sempre com um olho em nós.

O Verão era longo e depois vinha o tempo que passávamos na quinta, a brincar no tanque de água gelada, a dar de comer aos patos, às galinhas, a dormir na casota do cão; a regar a horta, de sacho na mão, a abrir caminhos para a água entrar e o cheiro dos tomateiros, da salsa. A viajar na carrinha de caixa aberta, com o vento quente a bater na cara e os olhos entreabertos.

A apanha da fruta, pêssegos, maçãs e, por último, a vindima. As férias de Verão eram tão compridas que podíamos fazer a vindima, de cestinha no braço e a tesoura na mão, a cortar os cachos das uvas, a deitá-los para a tina, a ir no tractor com o senhor António até à cooperativa onde deixávamos o fruto do nosso trabalho e da nossa diversão.

Eram quase quatro meses de dias compridos que pareciam pequenos com tanta coisa que havia para fazer! E sestas! E romarias! E, pelo meio, as viagens ao estrangeiro com os pais, quando estes tinham férias.

Hoje as férias da escola são mais curtas e nós não sabemos o que fazer com os miúdos porque já não há avós grandes e calorosas, donas-de-casa com as suas criadas e muitos netos à mesa, ao almoço e ao jantar. Hoje as avós trabalham ou têm pouca paciência para os miúdos.

“Porque é que achas que pago um balúrdio pelo colégio?”, ouço perguntar ao meu lado. Por estes dias, as aulas acabaram, eles têm dois meses e meio de férias e nós 22 a 25 dias... Não há família alargada e a opção passa por mais escola, desta vez mascarada de ATL, alguns funcionam nos estabelecimentos de ensino, outros em empresas, fundações e instituições.

Os miúdos vão à praia com a escola, fazem campos de férias por cá ou no estrangeiro e tudo isso é bom, acreditamos; eles têm mais oportunidades do que nós tivemos com a idade deles, aprendem línguas, conhecem autores e pintores contemporâneos, ouvem histórias, constroem-nas eles, convencemo-nos.

No fundo, no fundo, não é bem verdade porque o que eles gostam mesmo é de estar connosco, de preferência, sempre! E quando digo “connosco” não falo só dos pais mas dos tios, dos avós, da família.

Por isso, a proposta que deixo é que a família seja mais solidária. Porque é que não há um tio que vai de férias e leva os sobrinhos todos? Ou uma avó? Ou uma madrinha? Se as famílias fossem cooperantes entre si, em vez de pagar ATL's, pagavam-se gelados, refeições fora de casa, bilhetes de cinema, etc.

Utópico? Não! Eu adoro levar os filhos e os sobrinhos à praia, ao cinema, ao museu ou simplesmente ficarmos sem fazer nada! Adoro ensinar-lhes o que sei, ouvir o que sabem, fazer cara feia quando se portam menos bem, dar-lhes abraços, beijos e vê-los sorrir e então lembro-me das minhas férias e rezo para que eles não se esqueçam nunca de mim, como eu não esqueço a minha avó!

7 comentários:

  1. lindo texto! são essas as férias que quero para a minha filha.

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  2. Que bom que era...será que já não sabemos ser assim?

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  3. Os meus filhos (de 5 e 8 anos), este ano, deram-nos uma grande lição.
    Pediram para não irem para o ATL do Colégio na 2ª quinzena de Julho. É automático, em Maio ou Junho, já estão inscritos, nem me passou outra coisa pela cabeça...mas eles não! Pediram para ir uma semana para casa de cada avó! (No campo, com quinta e horta incluidas)
    "Temos a vida toda para ir ao cinema, ao teatro e aos parques. Com os avós, estamos tão pouco tempo..." e os avós (felizes) aceitaram de bom grado!
    Como é que eu nunca me lembrei disto antes?

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  4. Partilho em pleno as emoções deste texto...as minhas férias eram exactamente assim. Que saudades da minha avó! Tenho a sorte de ter os meus pais disponiveis a 100% para ficarem com o meu filho, e sempre que eu não estou eles deixam-no fazer tudo mas tudo que ele quer! Os avós são para isso mesmo! MIMAR

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  5. Este ano vou passar férias ao campo em casa dos meus pais com o meu marido e o nosso filho de quase 3 anos. A decisão motivada pela necessidade, cada vez mais tem sido sentida como uma óptima alternativa. O pequenote está radiante com a ideia de andar no meio dos animais horas infinitas, regar os campos e fingir que anda no tractor do avô, com a possibilidade de ir alguns dias à piscina e à praia.
    Para mim será certamente um regresso às origens e para ele provávelmente um verão para mais tarde recordar.
    Obrigado pelo texto que ainda mais reforça esta minha convicção.

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  6. Gostei tanto! Este ano mandei a patanisca de férias com o avô e o primo para terras do Alentejo. Foi a primeira vez que me separei dela em 8 anos de vida. Ontem telefonei-lhe e a alegria dela relembrou-me os meus dias de criança em casa da avó.

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  7. Também me lembro de ir para a "terra" das minhas Avós: ele era ir tomar banho no rio, andar de burro, de cavalo, era uma alegria :-)
    Agora é mais dificil porque as Avós do meu Becas são ambas da Linha de Cascais portanto a "terra" é cá mesmo :-)
    De qualquer modo uma tem quintal e anda sempre com ele no meio da terra e outra não mas, ao menos assim, sempre tem contacto com outras realidades.
    Embora me dê mais trabalho costumo levá-lo, desde que nasceu, á Golegã, a Santarém, a Vila Franca de Xira tudo para que possa ver animais e não pense que o leite vem do pacote e não existem vacas tal como se passou numa reportagem que deu anteontem na TVI.
    Ainda estas 2 últimos dias andei numa correria para que ele saisse do colégio e pudéssemos ir para a praia: dá mais trabalho mas andam mais felizes por andarem na rua e, mais tarde, não espero troféus mas gostaria que ele dissesse "a minha Mãe sempre foi comigo para todo o lado e eu fui uma criança feliz" - é para isso que eu me esforço todos os dias.

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