segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Estudar e fazer trabalhos de casa é a mesma coisa?

Por Maria José Araújo*

Há uma diferença muito grande entre fazer trabalhos de casa (TPC) e estudar.

Estudar tem de ter a adesão voluntária das crianças. Deve ser algo que elas percebam e por que se interessem. Perceber que conhecer, aprender e ter a possibilidade de participar no mundo de uma forma informada é algo estimulante, e as crianças gostam deste sentimento. Estudar é perceber mais e melhor... O conceito de estudar é muito confuso para as crianças e elas só o vão percebendo com o decorrer da escolaridade e à medida que se vão confrontando com outras situações – como, por exemplo, estudar a tabuada, estudar para um teste – e, mesmo assim, tudo isso depende delas. A função de estudar, não sendo uma operação muito concreta, é algo que não é muito claro para as crianças nem, provavelmente, para os adultos com quem convivem. Ou será ?

As crianças têm múltiplos interesses que são desprezados em função da “matéria escolar”. Todos sabemos disto – o que muitas vezes não sabemos é o que fazer para corrigir esta desatenção. Se se confundir TPC com estudar, estamos a dizer às crianças que estudar é aquele trabalho repetitivo, cansativo e mecânico que é proposto na maior parte dos TPC. É muito importante que se entenda isto, senão para alem de uns bons momentos de convívio ao fim do dia em casa com os filhos, é o conhecimento e a própria Escola que estamos a desvalorizar.

A maior parte das crianças não gosta de fazer “trabalhos de casa”, mas aceita a obrigatoriedade da tarefa mais ou menos pacificamente. Outras, contudo, manifestam-se. Apesar das dificuldades (não sabem fazer ou estão cansadas após um dia na escola), os “trabalhos de casa” aparecem sempre como alguma coisa que faz parte dos seus quotidianos, que está naturalizada e que, portanto, não se questiona - (...) temos de fazer todos os dias e muitos... Ou cuja realização é condicionada pelo medo – se não fizer a minha professora ralha-me (...).

Há, como sabemos, muitas formas de aprender e de ensinar, como há muitas de estudar. O acto de estudar, como de ler, não é de fácil de ensino. Para ajudarmos as crianças a perceber o que significa estudar, qual o significado de estudar, é preciso respeitar algumas regras que se prendem com o ritmo de cada criança e com a forma que cada um arranja para satisfazer a sua curiosidade. As crianças são todas diferentes e, portanto, têm formas diferentes de se adaptar e se interessar.

Precisamos de compreender que as propostas de trabalho que exigem estudo e esforço têm de ser sentidas pelas crianças como verdadeiramente importantes e suficientemente interessantes para que a elas adiram com vontade e para que as valorizem, para que as trabalhem com gosto. Caso contrário, mal comecem a ter alguma autonomia, deixam o estudo aprofundado de lado e fazem somente o mínimo necessário para passar de ano. É neste sentido, que não se pode confundir TPC e estudo. Quando se obriga a memorizar e repetir, estamos a impor uma concepção já programada e raramente as crianças aprendem a pensar, a pôr em causa, e isso não as ajuda a perceber e ficar com vontade de continuar.

* Maria José Araújo é investigadora da Universidade do Porto e autora especializada em tempos livres.

2 comentários:

  1. Parece-me que aqui se está a ligar o conceito de TPC apenas a tarefas massadoras e repetitivas, mas o que talvez a autora queira dizer é que o TPC, em vez de ser massador e repetitivo, pode e dever ser um desafio ao espírito crítico e à próactividade e busca de conhecimento por parte da criança. anita

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  2. Como se justifica, por exemplo, a primeira afirmação? Nenhuma das afirmações seguintes a justifica e muitas delas carecem também de justicação, pois não são auto-evidentes.

    Há tarefas repetitivas (como decorar a tabuada ou regras de gramática) que são muito úteis e constituem a base de aquisições e compreensões futuras. Não são criativas mas não inimigas da criatividade, pois dão instrumentos à criatividade.
    Essa ideia é defensável com argumentos pedagógicos e psicológicos, mas também neurológicos (ver aqui: http://criticanarede.com/html/excelencia.html)

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